Esportes

Após denunciar abuso de ex-técnico, Lucas Altemeyer mantém mesmo amor à ginástica

Lucas foi a segunda vítima a mostrar a cara após ter prestado depoimento no inquérito policial que investiga o ex-treinador de ginástica artística Fernando de Carvalho Lopes

Redação Folha Vitória

Lucas Altemeyer de Oliveira queria disputar uma Olimpíada. Ginasta desde os 8 anos de idade, o mais perto que chegou deste sonho foi servir a seleção brasileira juvenil como reserva. Quatro cirurgias no ombro acumuladas, decidiu, em 2013, que era hora de aceitar o fato de que o corpo não suportava mais. Desistiu 16 anos depois de ter começado. Incrível, porém, foi ter suportado tanto - e tal afirmação nada tem a ver com dores musculares.

A história do ex-ginasta de São Bernardo ganhou repercussão mundial no último dia 2. Lucas foi a segunda vítima a mostrar a cara após ter prestado depoimento no inquérito policial que investiga o ex-treinador de ginástica artística Fernando de Carvalho Lopes.

Conviveu com o técnico de 2003 a 2005, período no qual chegou a ser capitão da equipe do Mesc (Movimento de Expansão Social Católica), clube particular da cidade onde nasceu. Lá, Fernando construiu boa parte da carreira e, segundo diversas vítimas, teria cometido abusos sexuais entre os anos de 1999 e 2016. Uma delas é Lucas, que somente há duas semanas tomou coragem para contar coisas que nem seus pais, José e Mercedes, sabiam.

"Eu fiquei chateado comigo mesmo. Como capitão, eu poderia ter sido mais forte, mas sei lá, era só um adolescente. E como eu não consegui ser o melhor cara naquela época, agora que eu tenho consciência, pensei: ‘Eu vou lá falar com o rosto aberto’. Porque, de repente, os outros meninos que se lembram de mim como capitão podem me reconhecer e se sentirem encorajados a falar também", disse o ex-ginasta, em entrevista ao Estado.

Em tese, ele tinha tudo para se afastar do esporte, como muitos colegas de treino, traumatizados e desestimulados, fizeram. Mas sua paixão e obsessão o levaram adiante. Em São Caetano, ficou mais oito anos frequentando ginásios, fazendo acrobacias e "rasgando a mão" nas barras e argolas, algo comum a atletas da modalidade. Quando percebeu que ir aos Jogos Olímpicos já não era mais possível, aposentou-se como atleta. Mas achou uma maneira de não abandonar a ginástica.

A convite de um amigo, fez as malas em julho de 2013 e foi passar por um período de testes como acrobata da Cavalia, uma companhia circense sediada em Montreal, no Canadá, e criada por Normand Latourelle, um dos fundadores do Cirque du Soleil. Nunca mais voltou ao Brasil, a não ser para visitar a família e os amigos.

"Nos primeiros meses, eu já estava fazendo o show inteiro, o pessoal ficou impressionado. Como eu meio que sentia que havia fracassado na ginástica, entrei aqui para ser o melhor de todos. Vim de cabeça com a ideia de atleta de ser top, de representar meu país."

No palco, ele encontrou, enfim, o sucesso que tanto perseguiu nos ginásios. Hoje, questionado se o Lucas acrobata é melhor do que o ginasta, responde sem titubear: "Sim. Eu tinha muitos objetivos na ginástica e alcancei poucos. No circo, consigo trabalhar minhas habilidades de ginasta com minha personalidade. Você pode até não executar o melhor exercício, mas, se atuar de forma a mostrar seu verdadeiro sentimento, você ganha o público. E eu entendi isso rápido. Aí, decolei."

Abrir-se publicamente, mostrar sentimentos. Tudo isso teve um efeito reparador para ele. E a ginástica artística? O que, afinal, ela representa em meio à toda essa história?

"A ginástica me deu tudo o que tenho até hoje. Meus pais nunca precisaram pagar escola, faculdade. Conheci minha esposa por conta da minha vida na modalidade, os meus melhores amigos hoje em dia ainda são daquela época. E a personalidade que tenho de querer ir para frente, batalhar, vencer, não desistir... O esporte colocou isso na minha cabeça: você vai cair 15 vezes, cara, mas vai se levantar e, uma hora, vai dar certo".

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